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01/04/2004
Ziulkoski faz avaliação da Marcha e alerta para que o movimento continue vigilante
Ivone Belem e Nilo Dias
Agência CNM
O presidente da CNM, Paulo Ziulkoski, faz uma avaliação positiva dos resultados da VII Marcha a Brasília em Defesa dos Municípios. Mas alerta que é preciso manter o movimento vigilante porque a luta municipalista é um processo dinâmico e inesgotável que visa a melhorar a vida do cidadão.
Agência CNM - Qual a sua avaliação desta VII Marcha?
Paulo Ziulkoski – A Marcha foi um sucesso. Aqui estiveram mais de 2.500 municipalistas. As presenças do Presidente da República e de 15 ministros mostram o reconhecimento do Governo Federal ao trabalho que a Confederação Nacional de Municípios (CNM) vem desenvolvendo. O avanço foi grande, mas o importante é a vigilância agora. O presidente já se comprometeu a estar presente e novamente avaliar o que andou neste ano de 2004. Tenho certeza que, embora sendo um ano de eleições municipais, vamos continuar construindo e melhorando essa relação.
Agência CNM – A Marcha se consolida como um movimento vitorioso?
Paulo Ziulkoski - A marcha, que já chegou à sétima edição, é uma criação do nosso movimento, da nossa entidade. É uma conquista da CNM. O número de participantes, a presença do Presidente da República, dos ministros e de três governadores sinaliza a pujança do nosso movimento. E ele só é pujante no sentido de participação e de legitimidade porque as propostas são defendidas com muita ênfase.
Agência CNM – Os resultados positivos para os municípios estão aparecendo?
Paulo Ziulkoski - Nós estamos revertendo aquele processo dos últimos anos em que os municípios apenas recebiam atribuições e os recursos diminuíam. Em 1992, tínhamos 19,5% do bolo e em 2002 caímos para 14,5%. Perdemos 5% de toda a arrecadação nacional. Se olharmos 2003, quando foram arrecadados R$ 530 bilhões perdemos mais de R$ 25 bilhões. Então, a partir dali nós estancamos esse processo de queda e passamos a recuperar. Estamos conquistando, não tudo aquilo que precisamos, merecemos ou queremos, mas o que é possível.
Os vários pontos de conquistas estão registrados em toda a história da entidade e mostram que o movimento avançou. No ano passado tivemos conquistas valiosas como a solução da iluminação pública, transporte escolar, salário educação, Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) e uso dos depósitos judiciais.
Agência CNM – E as conquistas desta VII Marcha?
Paulo Ziulkoski – Agora na VII Marcha o Presidente anunciou valores importantes, principalmente para á área do transporte do ensino fundamental na área rural, com acréscimo de R$ 80,00 aproximadamente por ano, por aluno transportado, o que dá R$ 0,38 por dia. Isso já passa a vigorar, são R$ 250 milhões. A questão do Ensino de Jovens e Adultos (EJA), que também está aumentando o valor para R$ 440 milhões.
Tivemos vários anúncios no Plano de Safra que também aumentou, creio que uns 500%. O Programa de Atenção Básica (PAB), da saúde é uma luta histórica, pois hoje é pago somente R$ 10,00 por habitante/ano. Estamos pleiteando um aumento que já foi concedido em parte, de 50% só para os municípios que estão abaixo do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) de 0,7%.
Agência CNM - Da pauta das reivindicações trazidas para esta Marcha quanto foi atendido e o que é que fica?
Paulo Ziulkoski – Foi atendida uma parte significativa da nossa pauta. A Merenda Escolar, que é o cotidiano das nossas crianças há 10 anos é de R$ 0,13 por refeição/dia. Para o remédio recebemos R$ 0,98 por habitante/ano. Temos outros pontos: o Governo deve para estados e municípios R$ 15 bilhões do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef), que financia a Educação. É um dinheiro que deixou de entrar nas escolas.
Estou falando na Educação e alguma coisa da Saúde. Imagine na agricultura, no saneamento onde vivemos uma crise com muitas doenças campeando por aí por falta de água potável, saneamento e esgotamento. Temos crianças brincando nos lixões. Mas já houve algum avanço. Melhorou pelo menos um pouco.
Agência CNM – Ainda são muitas as necessidades dos municípios?
Paulo Ziulkoski - É um processo quase inesgotável, pois sempre vai ter uma questão ou outra. Precisamos terminar a Reforma Tributária, na qual esperamos confirmar um aumento do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), a questão da retirada do valor adicionado do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), do Fundo de Desenvolvimento Regional (FDR) e do Imposto Territorial Rural (ITR).
Agência CNM – Qual o principal destaque desta VII Marcha?
Paulo Ziulkoski - O principal foi que pela primeira vez na história do Brasil sentaram juntos na mesma mesa a União, governadores e prefeitos, para discutir essa proposta da CNM de revisão do pacto federativo. No momento que isso for aprofundado vai mudar a face do Brasil. Não podemos mais ficar só querendo criar impostos, temos que retornar serviços e harmonizar essa situação.
Agência CNM – Qual é a celeuma que tem hoje entre União, estados e municípios que vem desde a I Marcha?
Paulo Ziulkoski – Isso vem desde antes da I Marcha. No meu Estado, o Rio Grande do Sul, vem desde a Revolução Farroupilha, que já era uma questão federativa quase 200 anos atrás. Hoje a União cobra os tributos, centraliza e retém 62% de toda a arrecadação nacional. O dinheiro fica aqui em Brasília, a maioria para pagar juros. É o modelo que temos. Na maioria dos municípios continuamos limpando as ruas, recolhendo lixo, fornecendo iluminação pública, distribuindo remédios para os idosos, garantindo saúde básica, transporte escolar, merenda escolar. O problema é definir competências.
Agência CNM – Se a Reforma Tributária acontecer como os prefeitos estão querendo vai resolver parte dos problemas?
Paulo Ziulkoski – Pode não resolver tudo, mas ameniza e melhora muito. No final do ano passado alguns prefeitos não estavam conseguindo pagar o 13º salário e muitos nem o salário do mês. É uma realidade. Se vier esse R$ 1,3 bilhão do FPM, não digo que soluciona, mas talvez seja direcionado em novembro para o final de mandato. A Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) é muito rígida. O artigo 42 moralizou a gestão pública. Um prefeito não pode iniciar uma obra sem terminá-la até o final do seu mandato, ou contrair um empréstimo e deixar para o outro pagar. Isso é o correto. Mas os prefeitos vão ter dificuldades para chegar ao final do ano sem deixar restos a pagar, porque se acumulou do ano passado pára cá uma queda na arrecadação.
Agência CNM – Não existem alternativas que minimizem essas dificuldades?
Paulo Ziulkoski - O prefeito não tem como deixar de fornecer a merenda escolar, não pode deixar de recolher o lixo. O prefeito não tem como escolher. A União corta, diz que vai contigenciar mais R$ 6 bilhões, R$ 10 bilhões, R$ 50 bilhões e tudo bem. Os governadores também na Saúde, por exemplo, não gastam aquilo que deveriam gastar por determinação constitucional. Estou falando no geral, governadores, secretários e ministros de estado têm um tratamento, nós, prefeitos, temos outro. A toda a hora a Controladoria Geral da União diz que 70% dos municípios estão em situação irregular. Como se entende isso: houve desvio e em quê? Será que o prefeito roubou ou é o dinheiro que às vezes foi mal aplicado sem dolo?
Então, tudo isso tem que ser discutido. E está evoluindo, é um processo. Eu acho que a Marcha consolida essa relação e nos remete para que se possa harmonizar isso, porque, caso contrário, quem perde é o contribuinte.
Agência CNM – A CNM já está pensando na VIII Marcha a Brasília em Defesa dos Municípios?
Paulo Ziulkoski – Com toda a certeza. O Presidente da República e seus ministros já anunciaram presença novamente. Voltam porque é um processo inesgotável. Nós vamos morrer, virão outras gerações e essa situação vai continuar, porque isso é histórico, não só no Brasil é no mundo inteiro. Na Europa essa luta é natural. A Alemanha hoje passa por essa crise entre municípios, estados e a União. Uma crise profunda. A França, que tem 35 mil municípios, está na mesma situação, a Itália idem. É um processo internacional a questão do recurso, faz parte do nosso cotidiano.
Agência CNM – Para o senhor, o quê realmente mudou a relação da União com os municípios?
Paulo Ziulkoski – Acredito que tem a vontade do presidente Lula. Ele manifestou isso. A gente sente quando a pessoa fala com o coração. Mais do que tudo, é a nossa mobilização. Por isso, as comunidades devem valorizar os prefeitos que vêm a Brasília. É um processo que está em andamento e para que tenha continuidade é preciso que os prefeitos continuem nessa luta municipalista, principalmente os que serão eleitos ao final deste ano. Entendo que vai haver uma renovação de 80%. Esses novos prefeitos é que deverão se engajar agora e aumentar ainda mais o movimento, que está em crescimento.
Agência CNM – Essa renovação pode implicar em novas propostas ou a agenda construída ao longo deste mandato vai ser cobrada até a última linha?
Paulo Ziulkoski – A Marcha vai continuar. Essa renovação de prefeitos vai se defrontar com essa pauta, até porque o município não é propriedade do prefeito nem de um partido político. É uma instituição que trabalha com uma previsão orçamentária que não se pode mudar radicalmente. Ela trabalha naquela lógica. Isso vai ser seguramente conduzido pelos novos prefeitos.
O que estou falando é que alguns se iludem acreditando que têm muita capacidade e que ao entrar na Prefeitura podem resolver tudo. Depois verificam que não é bem assim. Tivemos muita luta e até fomos corridos por cães daqui de Brasília. Agora, graças à nossa pacífica e ordeira mobilização, o dinheiro que é do cidadão está indo diretamente para o município.
Sabem como era o transporte escolar até o ano retrasado? Alguns deputados iam até o prefeito e apresentavam um projeto para a compra de veículo. Uma Kombi velha ou um ônibus velho e o prefeito ainda ia bater palma para o deputado. Não estou condenando quem fazia. Estou dizendo que não deve mais ser assim. Não é um ônibus que vai solucionar e nem um partido que está no Governo ou outro. Temos que dar atenção a todos, não interessando cor partidária.
O prefeito tem de ter a solução e é para isso que estamos lutando, para terminar com essas formas intermediárias que reproduzem um modelo nefasto e perverso para o Brasil. Temos que terminar com oligarquias e interesses pessoais. Temos que trabalhar para o cidadão. Esse é o nosso papel.